quarta-feira, 7 de julho de 2010

Aconselhamento e Psicologia

Tenho ouvido de muitos pastores e líderes cristãos sobre a necessidade de se treinar pessoas para exercerem o ministério de aconselhamento. A Bíblia diz que devemos exortar os insubmissos, consolar os desanimados e amparar os fracos (cf. 1 Ts5.14). Creio que esta seja uma tarefa de toda a igreja, entretanto, creio também que Deus capacitou algumas pessoas para exercerem esse ministério de consolo e ajuda, tão necessário à igreja.
Para ser um bom conselheiro, é preciso conhecer bem a Bíblia. Paulo instrui Timóteo a manejar bem a palavra da verdade (cf. 2 Tm 2.15), porém o bom conselheiro precisa também conhecer o ser humano em profundidade. E é aí que entra a contribuição das ciências humanas, como a Psicologia, a Antropologia e a Sociologia, fornecendo ferramentas que ajudam a conhecer melhor as pessoas e a tornar o aconselhamento mais eficaz.
Isso naõ significa que ao recorrer às ciências humanas o conselheiro esteja rejeitando a suficiência das Escrituras na prática do aconselhamento. Creio que é possivel praticar um aconselhamento embasado nas Escrituras e ao mesmo tempo recorrer aos recursos fornecidos pela Psicologia ou pela Sociologia com o fim de obter melhores resultados.
Uma das justificativas para não se recorrer ao auxílio da Psicologia é o temor de que isso possa mexer com a cabeça dos crentes e abalar nossa fé. Porém, se estamos seguros de nossas crenças, não temos o que temer. No fundo, temos receio que a Psicologia questione nossa fé, nossas convicções (que não são talvez tão firmes como gostaríamos que fossem), nossas crenças, e acabe nos afastando da igreja.
Porém, a fé que resiste a um questionamento sai fortalecida. Se não permito que minhas crenças sejam contestadas, é bem possível que eu mesma não esteja tão convicta de sua veracidade...
O que você acha? Gostaria de ouvir sua opinião.

sexta-feira, 11 de junho de 2010

Uma linda poesia de Adélia Prado

Estava tentando dar uma organizada nos meus arquivos quando encontrei essa linda poesia de Adélia Prado.
Note a delicadeza e a sensibilidade das palavras... a serenidade implícita nessa imagem, "...Repouso meu rosto nesta areia ... envelhecendo em paz, como envelhece o que é de amoroso dono".
Lindo demais, não?

Leia a seguir o texto completo, calmamente, saboreando cada palavra.

Se não fosse a esperança de que me aguardas com a mesa posta,
o que seria de mim não sei.
Sem o teu nome
a claridade do mundo não me hospeda,
é crua luz crestante sobre ais.
Eu necessito por detrás do Sol,
do calor que não se põe e tem gerado em meus sonhos,
na mais fechada noite, fulgurantes lâmpadas.
Porque acima e abaixo e ao redor do que existe,
permaneces.
Eu repouso meu rosto nesta areia,
contemplando as formigas, envelhecendo em paz,
como envelhece o que é de amoroso dono.
O mar é tão pequenino diante do que eu choraria
se não fosses meu Pai,
Ó Deus, ainda assim não é sem temor que te amo, nem sem medo.

segunda-feira, 7 de junho de 2010

Deus de justiça, Deus de misericórdia

Tenho observado que grande parte das mensagens dirigidas aos crentes nas igrejas se parece mais com uma lista de deveres e obrigações. Somos advertidos de que precisamos orar mais, ler mais as Escrituras, evangelizar mais, nos dedicarmos mais à obra do Senhor (leia-se à igreja) etc. Às vezes, tenho a impressão que Deus está sempre me cobrando alguma coisa, algo que deixei de fazer, ou que Ele desaprova. O Deus que as igrejas nos apresentam é muito mais um Deus de justiça do que de misericórdia. Se eu "andar na linha" não tenho o que temer, mas se eu "pisar na bola" a mão de Deus irá pesar sobre mim. É como costumamos dizer: fez, levou!
Esta imagem de um Deus justo, que está pronto a nos disciplinar quando erramos é típica do Antigo Testamento. O Deus que vemos ali é um Deus que recompensa aqueles que lhe obedecem e castiga aqueles que são desobedientes e não buscam fazer a sua vontade. Encontramos várias passagens do AT confirmando esse princípio: "Obedeceremos à voz do Senhor para que nos suceda bem"(Jr 42.6), "o mau não ficará sem castigo, mas a geração dos justos é livre" (Pv 11.21), "Guarda, pois, os seus estatutos e os seus mandamentos que te ordeno, para que te vá bem" (Dt 4. 40), "Quem procura o bem alcança favor, mas ao que corre atrás do mal, este lhe sobrevirá" (Pv 11.27). Porém, o Novo Testamento nos revela um Deus que além de justo é também misericordioso. Um Deus que tomou sobre si o castigo que merecíamos e que está sempre pronto a nos receber de volta, com os braços estendidos. O Deus que Jesus nos mostra é um Deus perdoador, um Deus que nos acolhe, que nos recebe como somos e não nos retribui segundo nosso merecimento.
A melhor figura desse pai está na parábola do filho pródigo. Quando o filho volta para casa, depois de ter esbanjado a fortuna do pai em uma vida de pecado, em vez de passar-lhe um "sermão", o pai o recebe com uma festa! O texto dá a entender que o pai esperava ansiosamente pela volta do filho, pois avistou-o quando ainda estava longe, e "compadecido, correu, o abraçou e beijou".
Deus é justo, mas é também compassivo e misericordioso, tardio em irar-se e pronto a perdoar. Ele não fica à espreita, esperando que a gente caia em pecado para nos castigar. Ao contrário, Ele tem prazer em nos perdoar. "É o amor que sempre acolhe de volta à casa e deseja comemorar", nas palavras de Henri Nouwen; "O Deus que Jesus anuncia, e em nome de quem age, é o Deus da compaixão, o Deus que oferece a si mesmo como exemplo e modelo para todo o comportamento humano".

segunda-feira, 10 de maio de 2010

Em quem você coloca sua esperança?


"O que mais nos falta, no caos em que se transformou o mundo atual, é fé. Quando o homem sepultar suas dúvidas e incertezas e confiar plenamente no Deus que tudo pode, deixará de ser um fraco e se tornará forte; deixará de ser um fracassado para se tornar um grande vencedor; deixará de ser um perdido e passará a fazer parte do exército dos redimidos do Senhor." (texto extraído da mensagem do dia 10/05 enviada pelo site Um Pouco de Luz).

Costumo abrir meus e-mails logo cedo, separando aqueles que me interessam, para serem lidos mais tarde, e os que não me interessam, que são colocados na lixeira. Geralmente, dou uma passada de olhos antes de deletar as mensagens.
Hoje não foi diferente... Passava um pouco das 7h quando abri minha caixa postal e comecei a conferir as mensagens. Nada importante, pensei, talvez por ser ainda muito cedo. Dei uma olhada por cima nos devocionais online que me enviam - 4 ou 5 por dia -e já me preparava para apertar a decla "deletar" quando meus olhos se depararam com a frase acima (em itálico).
O que mais falta no mundo atual é fé... no entanto, as pessoas costumam afirmar que têm tanta fé... Mas não é desse tipo de fé que o mundo precisa. Precisamos ter fé no Deus vivo!
Nesses últimos dias, tenho ouvido algumas pessoas me dizerem: você precisa ter fé! Mas de nada adianta ter uma fé vazia, uma fé em um Deus conteúdo. Nossa fé precisa estar firmada naquele que é fiel e verdadeiro. A fé não é um salto no escuro. A Bíblia diz que pela fé Abraão deixou sua terra e iniciou sua jornada para um lugar desconhecido. Embora ele não soubesse para onde estava indo, Abraão confiava no Deus que o havia chamado.
Estou passando por um período difícil... Às vezes tenho a impressão de que minha fé é muito pequena, e como os discípulos, peço a Deus para que aumente a minha fé. Apesar de confiar no Senhor, muitas vezes sinto minha fé vacilar. Mas quando leio as histórias dos grandes homens de Deus vejo que todos eles fraquejaram e passaram por fortes crises de desânimo e perda de esperança. A mensagem do culto de ontem foi exatamente sobre um deles, Elias, que mesmo depois de obter uma grande vitória sobre os profetas de baal, não consegue evitar que o desânimo tome conta de sua vida, a ponto de desejar a morte! O Senhor, porém, lhe restaura o ânimo e provê o seu sustento...
E restaura também o meu, por isso posso dizer que a minha esperança está no Senhor e nele se alegra o meu coração, pois confio no seu santo nome. (Sl 33.20-21). "Na tua palavra coloquei a minha esperança" (Sl 119.81); e "o meu futuro está em tuas mãos" (Sl 31.15).


sábado, 24 de abril de 2010

A sabedoria dos rabinos

Ultimamente, tenho deixado um pouco de lado os livros de autores evangélicos para beber de outras fontes. Esta tem sido uma experiência muito agradável e enriquecedora. Nessa procura por diversificar meus hábitos de leitura, tenho descoberto alguns autores que normalmente não são citados (ou recomendados) pelos líderes das igrejas evangélicas, de modo geral.
Quando menciono para algumas pessoas o que tenho lido, percebo que elas não reagem favoravelmente. Algumas perguntam por que gastar tempo lendo autores não-evangélicos se podemos aproveitar muito mais lendo livros recomendados pela igreja; outras chegam a sugerir algumas leituras que, de acordo com elas, seriam muito mais proveitosas.
Outras ainda têm suas próprias listas de livros "proibidos" e olham com suspeita para aqueles que se dedicam a esse tipo de leitura, considerando-os como hereges em potencial.
Pessoas assim, em geral, estão tão preocupadas em "preservar a sã doutrina" que se esquecem que a própria Reforma Protestante nasceu da coragem de um homem em contestar a doutrina defendida pela igreja.
Além disso, encontramos na Bíblia um elogio aos crentes de Beréia, por sua demonstração de maturidade. Eles não se recusaram a ouvir a mensagem pregada por Paulo, ao contrário, ouviram com interesse, mas depois conferiam "se tudo era assim mesmo".
As Escrituras também nos recomendam a examinar tudo e reter o que é bom (I Ts 5.21).
Tenho aprendido muito lendo autores dos primeiros séculos da igreja, como Agostinho, Tomás à Kempis, São João da Cruz, Teresa de Ávila, e outros mais recentes, como Henri Nouwen, Tomas Merton, Brennan Manning, Brian McLaren (esse último considerado por muitos um herege).
Mas, atualmente, estou lendo um livro escrito por um rabino, Jonathan Sacks, intitulado Para Curar um Mundo Fraturado. Ainda não cheguei à metade do livro, mas já deu pra sentir que é um daqueles livros pra gente ler com caneta e lápis na mão, sublinhando frases, acrescentando comentários, fazendo anotações nas margens.
Transcrevo a seguir alguns trechos que me tocaram profundamente:

"Nós estamos aqui para fazer diferença, para corrigir as fraturas do mundo. Um dia por vez, um ato por vez, pelo tempo que for preciso para fazer do mundo um lugar de justiça e compaixão onde os solitários não estejam sós e os carentes encontrem ajuda; onde a súplica do fraco seja atendida e os injustiçados sejam ouvidos."

"Deus não pede a seus filhos que não cometam erros... Deus pede apenas que eles reconheçam seus erros e deles aprendam. O perdão está inscrito na estrutura do universo."

"Deus quer que seu povo ouça a súplica do oprimido, a dor do aflito e o lamento do abandonado. quer que não aceitem o mundo como é, porque o mundo não é como deveria ser."

"Encontramos a imagem de Deus dentro de nós quando a discernimos no outro."

Outra hora citarei mais um pouco da sabedoria desse rabino, que desde 1991 é o rabino-chefe da Comunidade Britânica.


segunda-feira, 29 de março de 2010

Jacó e a justiça de Deus

Tenho pensado bastante ultimamente na história de Jacó. Não se pode dizer que Jacó tinha um bom currículo. As Escrituras começam a descrevê-lo desde o nascimento como 'usurpador' e 'enganador'. A maneira predileta de Jacó conseguir aquilo que pretendia era através de negociações. Assim, ele negociou o direito de primogenitura com seu irmão, negociou seu casamento com Labão e tentou até negociar sua fidelidade para com Deus (Gn 28.20-22). Jacó vivia de acordo com um senso de justiça retributiva, baseada no mérito, pelo qual se eu não fizer a minha parte, Deus não vai me abençoar. Mas uma justiça baseada no mérito está destinada ao fracasso.
A história de Jacó é a história de todos nós. Ela nos mostra que o fundamento da justiça divina é a graça. Embora Jacó não tivesse um coração voltado para Deus, Deus continuou a abençoá-lo, pois a bênção de Deus não está restrita ao que eu faço, se sou ou não submissa e obediente à sua lei, mas no fato de Deus derramar sua graça sobre mim, independente do fato de eu ser merecedora ou não.
O perigo de condicionarmos as bênçãos de Deus ao nosso comportamento, achando que se errarmos Deus vai nos punir, e se formos 'bonzinhos' Ele irá nos recompensar, é que essa atitude nos torna exigentes e intransigentes, conosco e com os outros. Era assim que agiam os fariseus, duramente criticados por Jesus por suas atitudes legalistas e hipócritas.
Não somos melhores que Jacó. Somos pecadores como ele, e dependendes como ele da graça e da misericórdia de Deus.

segunda-feira, 22 de março de 2010

Além da Luz e da Sombra

Esse texto diz tudo que eu queria dizer, mas não sabia bem como fazê-lo. Trata de algumas coisas sobre as quais tenho refletido ultimamente: tolerância, acolhimento, misericórdia...

A frase abaixo, retirada do texto, é uma dessas pérolas que a gente encontra por aí, meio que por acaso, mas que nos faz pensar por um bom tempo...

"A verdade sem amor é inquisição, e o amor sem verdade é permissividade."

ALÉM DA LUZ E DA SOMBRA

Tornar-se adulto é passar da idade dos contrários para a idade do complementar, para um outro modo de olhar as coisas. Se alguém diz algo contrário ao que penso e sou capaz de entender esse contrário como complementar, vou crescer em consciência e em compreensão. Se em vez de rejeitar ou negar alguns elementos de minha vida obscura, sou capaz de acolhê-los, tornar-me-ei mais inteiro.

A sombra é o que dá relevo à luz. Quando amamos alguém, um dos sinais de amor verdadeiro é que amamos os seus defeitos. É fácil amar os defeitos de nossos filhos. É difícil amar os defeitos dos adultos ou de nossos cônjuges. Esse amor de que falamos não significa complacência, não é dizer ao outro que me agrada o que ele tem de desagradável, pois isso seria mentira e hipocrisia. O amor de que falamos é dar ao outro o direito de ser diferente. É dar a ele o direito de experimentar sua liberdade. De experimentar em mim mesmo esta capacidade de amar o que é amável e de amar, também, o que não é amável. Dessa maneira passaremos de uma vida submissa para uma vida escolhida (p. 83).

[...] Nossa vida vale pelo olhar que é posto nela. Os olhares de juiz nos enchem de culpa. Há olhares benevolentes, misericordiosos e ao mesmo tempo, justos. Precisamos desses olhares porque todos nós temos necessidade de verdade e de sermos amados. Por vezes, os olhares que encontramos são muito amorosos, muito doces, mas falta a eles a exigência desta verdade. Outras vezes, os olhares que se colocam sobre nós são plenos de verdade e justiça, mas falta a eles a misericórdia e o amor.

[...] Há um olhar integral do qual temos necessidade a fim de nos vermos tal e qual somos. Porque a verdade sem amor é inquisição e o amor sem verdade é permissividade. Estas são reflexões gerais e cada um pode entrar em particularidades que lhes são próprias, sentindo se existe em sua vida alguém que pode suportar sua sombra sem julgá-la, apesar de não se mostrar complacente com ela. Creio que todos nós temos a necessidade, pelo menos uma vez em nossas vidas, de tal olhar pousado sobre nós. Nesse momento não teremos mais necessidade de mentir, de nos iludirmos, de usarmos máscaras. Podemos mostrar nossa verdadeira face, nosso verdadeiro corpo, com seus desejos e seus medos. Podemos mostrar nossa verdadeira inteligência com seus conhecimentos e suas ignorâncias. Mostrar-se com o coração verdadeiro, capaz de muita ternura e também capaz de dureza e indiferença. Mostrar-se como não-perfeito, mas aperfeiçoável. Sob este olhar nossa vida pode crescer. Porque o olhar que nos julga e nos aprisiona em uma imagem nos faz ficar parados, enquanto que o outro olhar nos impulsiona a dar um passo adiante desta imagem que os outros têm de nós (p. 100).

LELOUP, Jean-Yves. Além da Luz e da Sombra – sobre a arte do morrer, do viver e do ser. Rio de Janeiro: Vozes, 2001. (grifo meu)